Campo grande News
Nem assinatura falsificada e produtor rural que nunca existiu impediu que o desembargador aposentado Júlio Roberto Siqueira Cardoso, que atuava na 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça e Mato Grosso do Sul, autorizasse o bloqueio indevido de R$ 5,5 milhões na conta bancária do engenheiro eletricista de Petrópolis (RJ), Salvador José Monteiro de Barros em maio de 2017. O caso é um dos que embasa investigação da Polícia Federal na Operação Ultima Ratio, que afastou cinco desembargadores e também o ex-desembargador, Júlio Cardoso, investigados por supostas compra e venda de sentenças. Nesse caso específico, o então juiz da 2ª Vara Cível, Paulo Afonso de Oliveira também é investigado. O caso parece inacreditável, principalmente por contar com um produtor rural fictício que nunca compareceu a nenhuma audiência , sempre amparado pelas alegações de sua advogada, a também investigada, Emmanuelle Alves Ferreira da Silva, esposa do juiz aposentado compulsoriamente, Aldo Ferreira da Silva Júnior. Em 2016, ela acionou a Justiça em ação de cobrança contra Salvador José, simulando que este havia comprado do produtor rural João Nascimento dos Santos a Fazenda Campo Limpo, localizada no município de Tangará da Serra (MT). Documentos falsificados por José Geraldo Tadeu de Oliveira e supostamente assinados por Salvador, foram usados para dar entrada no processo. Contra eles, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul abriu denúncia em julho de 2018, depois que a Dedfaz (Delegacia Especializada de Repressão a Crimes de Defraudações, Falsificações) registrou boletim de ocorrência feito pelo engenheiro petropolitano e comprovou as fraudes em investigação. O laudo que identificou a falsidade da assinatura está no inquérito da Polícia Civil. Por causa dessa denúncia, em julho de 2020, Emmanuele, José Geraldo e mais duas pessoas - Ronei de Oliveira Pécora e Delcinei de Souza Custódio - foram presos. O Campo Grande News noticiou este fato aqui . Mas por que há suspeita que houve venda de sentença neste caso? Em maio de 2018, Julio Cardoso suspendeu o andamento da ação com base nos indícios de falsificação, após recurso da advogada de Salvador contra decisão de primeiro grau, que bloqueou os R$ 5,5 milhões. Emmanuele questionou a determinação do então desembargador, e em 15 de junho, Cardoso reformou sua própria decisão. Três dias depois, há pedido de "João Nascimento dos Santos" para liberação dos valores bloqueados, autorizado por Paulo Afonso defere o pedido e emite guia de levantamento. Em 20 de junho, Emanuele avisa a gerente de sua agência bancária que abrirá uma conta em nome de seu suposto cliente. "(...) o denunciado José Geraldo Tadeu de Oliveira, passando-se pelo fictício 'João Nascimento dos Santos', compareceu na agência bancária no dia seguinte, 21 de junho de 2018, logo às 10 horas da manhã, mesma data e horário em que Emmanuele estava sendo ouvida na Dedfaz (...) e informava ao Delegado que seu 'cliente' estava em viagem para o Estado do Pará e também com problemas de saúde, razão pela qual não o apresentou ao delegado que já investigava o sofisticado esquema de falsificação de documentos que deflagrou a ação de execução ajuizada por ela". Ultima Ratio - Conforme a investigação da PF, "diante dos elementos acima expostos, entendemos que tudo aponta que o Juiz Estadual Paulo Afonso De Oliveira (da 2ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande-MS) e o Desembargador Julio Roberto Siqueira Cardoso (da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) foram corrompidos para favorecer indevidamente a advogada Emmanuelle Alves Ferreira da Silva, esposa do Juiz Aldo Ferreira da Silva Júnior, na obtenção indevida de mais de R$ 5 milhões". Isso porque, para a Polícia Federal, Paulo Afonso "ignorou todas as alegações de que os títulos executivos que baseavam a ação eram falsos, rejeitando a impugnação apresentada na ação de execução (sob o fundamento de não ser cabível) e os embargos à execução (sob o fundamento de intempestividade), determinando o pagamento de mais de R$ 5 milhões sem qualquer diligência para averiguar a autenticidade de tais títulos". Por sua vez, Cardoso, "sem qualquer fundamentação concreta revogou sua própria decisão anterior que impedia o prosseguimento da execução e permitiu o seguimento, mesmo ciente das alegações de falsificação dos títulos executivos". Vale ressaltar que foi só depois da investigação da Dedfaz que os magistrados reconheceram o erro de suas decisões.