Campo grande News
Vivemos em tempos de grande avanço tecnológico e proliferação de informações, mas paradoxalmente, enfrentamos uma crise que ameaça a base do nosso desenvolvimento humano e social: o desinteresse pela leitura. Este hábito, que deveria ser cultivado como um pilar essencial da educação e da formação cidadã, tem perdido espaço entre as prioridades da sociedade brasileira, com consequências preocupantes para o presente e para o futuro. Os dados são alarmantes. Pesquisas indicam que o brasileiro lê, em média, apenas quatro livros por ano, enquanto em países como o Canadá, esse número é três vezes maior. Esse deficit de leitura reflete-se em nossa posição nos rankings de educação global, como o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), que aponta que muitos jovens brasileiros têm dificuldade em interpretar textos básicos e relacionar ideias. Esse é um sintoma evidente de uma lacuna educacional que, se não tratada, pode perpetuar ciclos de exclusão social e estagnação cultural. A leitura não é apenas um ato mecânico de decodificar palavras; é uma prática transformadora que amplia horizontes, fomenta o pensamento crítico e nos conecta ao mundo de forma mais profunda. Sem ela, limitamos nossa capacidade de compreender o passado, interpretar o presente e projetar o futuro. Mais do que isso, perdemos a oportunidade de enxergar o outro com empatia e construir pontes de diálogo em uma sociedade cada vez mais polarizada. As causas dessa crise são múltiplas. A falta de incentivo à leitura desde a infância é um dos fatores centrais. Muitas crianças crescem em ambientes onde livros são vistos como artigos de luxo, e a escola, que deveria desempenhar um papel mediador, muitas vezes não dispõe de recursos ou estratégias eficazes para reverter esse cenário. Além disso, a crescente dependência das telas digitais tem transformado a maneira como consumimos informações, privilegiando conteúdos curtos e superficiais, que raramente exigem reflexão profunda. Como professor de Língua Portuguesa e Literatura em escolas públicas de Mato Grosso do Sul, percebo diariamente os impactos dessa realidade. Muitos alunos chegam ao ensino médio com dificuldade em interpretar um texto simples, o que compromete não apenas o desempenho acadêmico, mas também sua inserção no mercado de trabalho e sua capacidade de participar plenamente da vida em sociedade. Essa lacuna educacional é, sem dúvida, um dos maiores desafios de nossa geração. No entanto, há esperança. Um país que se reencontra com os livros pode, enfim, redescobrir a si mesmo. É preciso transformar cada página virada em uma ponte que ligue as palavras à ação, e cada leitura iniciada em uma jornada rumo ao futuro. Iniciativas como a democratização do acesso aos livros, a valorização de bibliotecas públicas e escolares, e a inclusão de tecnologias que promovam a leitura podem reverter esse quadro. Além disso, precisamos incentivar práticas que tornem a leitura parte da rotina familiar e comunitária, mostrando às crianças e jovens que ler não é apenas uma obrigação escolar, mas uma experiência prazerosa e enriquecedora. O desafio é grande, mas os benefícios são imensuráveis. Uma sociedade que lê é uma sociedade que sabe ler o mundo. A leitura, ao virar hábito, vira destino: transforma mentes, muda vidas, desenha futuros. Como dizia Mário Quintana, "os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler, mas não leem". Não podemos permitir que o Brasil seja um país em que as palavras morram antes mesmo de serem pronunciadas. Cabe a cada um de nós abrir novos capítulos nessa história, pois uma página virada para a leitura pode ser o prefácio de uma nova nação. (*) Luan Marcos Ferrari Pereira é professor de Língua Portuguesa e Literatura em escolas públicas de Mato Grosso do Sul. Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.